Geoconservação, um imperativo para a humanidade - o caso de Cabo Vede
A Natureza é integrada por dois
componentes essenciais:
1) Biodiversidade
– como
quantidade dos seres vivos existentes, suas espécies, características, sua
variação e diferenciação em todos aspectos da sua vida;
2)
Geodiversidade - como variedade de
ambientes geológicos, fenómenos e processos activos capazes de gerar paisagens,
rochas, minerais, fósseis, solos e outros depósitos superficiais que constituem
a base para a vida na Terra.
A ocorrência de um ou
mais elementos da geodiversidade (aflorantes quer em resultado da acção de
processos naturais quer devido à intervenção humana) dá-se a designação de Geossítio. Este encontra-se bem delimitado
geograficamente e apresenta valor singular do ponto de vista científico,
pedagógico, cultural, turístico, ou outro. O local com uma excepcional
concentração de geossitios designa-se por Área de interesse geológico e o conjunto de geossitios inventariados e caracterizados numa dada
região é o Património Geológico.
Como
forma de preservar os efeitos nefastos contra a natureza e mais concretamente
sobre a geodiversidade, surge o termo geoconservação, uma nova área de especialidade
das Geociências que se ocupa da identificação, avaliação, gestão e conservação
dos locais cujos valores da geodiversidade estão acima da média, isto é,
lugares cujas ocorrências geológicas possuem inegável valor científico,
pedagógico, cultural, turístico ou outros - os geossítios (Brilha,
2005).
A geoconservação tem por finalidade
reconhecer, preservar e valorizar os constituintes não vivos do meio natural
com significado e valor geológico, ou seja, valores de excepção representativos
da geodiversidade (“conjunto de ambientes geológicos, fenómenos e
processos activos geradores de paisagens, rochas, minerais fósseis,
solos e outros depósitos superficiais que constituem a base para a vida na Terra”
- Stanley, 2000).
Dependendo
da dimensão, do nível de impacte e do grau de vulnerabilidade dos elementos da
geodiversidade, que se propõem conservar, poderão ser aplicadas técnicas de
actuação complexas e avançadas ou uma simples norma de comportamento por parte do
geoconservador ou do próprio turista, adoptando as seguintes medidas de
prevenção:
- Proteger e manter a integridade de locais com relevância para a geoconservação;
- Contribuir para minimizar os impactes decorrentes de actividades que possam perigar os geossítios;
- Preservar as taxas e magnitudes das modificações de processos geológicos;
- Interpretar a geodiversidade para os turistas e outros visitantes de áreas protegidas;
- Promover a exploração sustentável dos recursos geológicos;
- Proteger, manter e monitorizar os geossítios;
Em muitos casos, como por exemplo
nas áreas protegidas a atitude conservadora não depende somente dos gestores,
da aplicação dos instrumentos jurídicos e dos políticos mas também do
comportamento individual ou colectivo dos visitantes (Carcavilla et al.,
2007).
A geoconservação perspectiva também
uma gestão sustentada dos recursos geológicos através do reconhecimento,
valorização e divulgação do património geológico, o que implica o cumprimento
dos seguintes objectivos:
a) Contribuir
para a preservação da biodiversidade e para a manutenção dos processos
ecológicos dependentes da geodiversidade;
b) Conservar
e assegurar a manutenção da geodiversidade
c) Encorajar
os geocientistas na pesquisa e proposta de mais geossítios para lista de
Património Mundial;
d) Contribuir
para a valorização do património geológico
A concretização desses objectivos
implica a adopção de estratégias locais e nacionais que promovam a
implementação de uma política ambiental susceptível de garantir a conservação e
valorização do ambiente, mormente no que se refere ao ordenamento do
território, protecção do litoral, criação de espaços protegidos (parques
naturais, sítios de interesse geológico entre outro.
Entre essas estratégias podemos
destacar as estratégias de geoconservação.
Uma estratégia de geoconservação
é um processo que visa pôr em prática as acções de conservação do
património geológico
Etapas de uma estratégia de
geoconservação
Inventariação
Quantificação
Classificação
Conservação
Valorização
e divulgação
Monitorização
Tendo
em conta a necessidade de implementar a geoconservação em Cabo verde
(arquipélago formado por dez ilhas sendo nove habitadas) foi concebida uma
estratégia de geoconservação para Cabo Verde cuja aplicação se restringiu à
ilha de Santiago a maior do país no espaço territorial e com maior concentração
populacional.
A
conservação da geodiversidade e do património geológico cabo-verdianos
justifica-se pela ocorrência de rochas formadas desde o Mesozóico (161 ± 4 M.
a.) - os calcários da ilha do Maio - até à actualidade (algumas rochas
vulcânicas na ilha do Fogo com apenas 17 anos de existência surgidas a partir
da ultima erupção vulcânica ocorrida em Abril de 1995).
Devido
à natureza arquipelágica do país, o que faz agravar os problemas logísticos, à
necessidade em estabelecer um programa de geoconservação que abranja de forma
completa todo o arquipélago e, ainda à dificuldade que os geocientistas de
vários países já relataram, quando do estabelecimento de uma estratégia de
geoconservação, entendemos que a melhor forma de conceber esta estratégia para
Cabo Verde é seguir uma metodologia idêntica àquela proposta pela ProGEO para o
estabelecimento de uma estratégia de geoconservação para áreas alargadas:
A
Conservação da Natureza é
considerada como todo tipo de gestão da Natureza, incluindo a protecção
integral, a utilização sustentável e a recuperação ou restauração de áreas
degradadas, visando a perpetuação das espécies e a manutenção da biodiversidade e de outros recursos naturais. A abordagem dessa questão requer
sempre que se tenha em conta os locais onde a conservação é prioritária, o tipo
de bem/objecto a conservar e a adopção da melhor estratégia no processo de
conservação. É necessário que haja definições claras e objectivas dos alvos da
conservação: espécies, comunidades, geossítios, áreas de interesse geológico entre
outros. Na Cimeira do Rio, de Janeiro em 1992, reconheceu-se que o então modelo
de crescimento e desenvolvimento, baseado na exploração dos recursos naturais
sem se levar em consideração a disponibilidade e a capacidade de renovação dos
mesmos, era inviável. Assim, enquadrado nas estratégias do desenvolvimento
sustentável propôs-se uma série de objectivos entre os quais o uso eficiente
dos recursos naturais, a restauração dos sistemas degradados e o reconhecimento
da importância do meio ambiente para o bem-estar humano (Carcavilla et al., 2007). O uso eficiente dos
recursos naturais e a restauração dos sistemas degradados requerem que se
reequacione os procedimentos face à exploração e gestão dos mesmos, uma vez que alguns recursos, designadamente os
geológicos não são renováveis. Daí a necessidade de desenhar novos recursos
tecnológicos para a sua exploração e investigação no domínio das Ciências
Geológicas (Uceda, 1980). Mas não basta redesenhar os recursos tecnológicos
para a exploração dos georecursos, é preciso também moldar a consciência
humana, sobretudo se considerarmos que, presentemente, em muitos países
subdesenvolvidos continua a haver uma sobre-exploração destes recursos como
forma de fugirem à pobreza (World Resources Institute, 2005). Por isso, é
importante que haja não só assinaturas de tratados internacionais e protocolos
de cooperação, mas também a realização de encontros internacionais, seminários
de formação local que ajudam a consciencializar a população e a transmitir-lhe
conhecimentos de modo a agir de forma mais ajustável às premissas da
sustentabilidade (Carcavilla et al.,
2007).
Por
outro lado, determinados fenómenos que ocorreram na Terra há milhões de anos, e
que estão registados em rochas, são únicos e, provavelmente, jamais se repetirão.
Estas e outras ocorrências geológicas de excepcional valor deverão ser
conservados de forma a evitar a sua degradação e garantir a sua perpetuação. A
conservação destas ocorrências passa pela geoconservação que tem como objectivo
a conservação e a gestão do património geológico e processos a eles associados
(Brilha, 2005).
Embora
reconheçamos que há necessidade de exploração e consumo dos recursos
geológicos, por vezes com algum valor, é necessário que se tenha a consciência
da sua escassez e que pode esgotar a qualquer momento, pelo que a sua gestão
deva ser feita de forma equilibrada e responsável pensando nas gerações
vindouras e na sustentabilidade do planeta terra. A melhor forma de os gerir é
integrá-los em áreas protegidas, uma vez que aí os sistemas de gestão estão
assegurados por regimes jurídicos que garantem a sua conservação e o uso
sustentável. O reconhecimento de que os elementos da geodiversidade de
excepcional interesse devem ser conservados é algo de muito recente pelo que são
muito raras as áreas protegidas declaradas por motivos exclusivamente
geológicos.
Nas últimas duas décadas tem havido uma
crescente consciencialização à volta desta questão pelo que a conservação
destes elementos é vista não só como algo possível, mas também necessário para
a permanência do homem como “ inquilino” do planeta Terra.
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